quarta-feira, 3 de janeiro de 2018

Remova os limites


Por Sheik Mohammad Abdullah Ansari

Um sábio lama tibetano escreveu:

“Vocês se lembram da história de um Geshe Kadhampa [um lama da linhagem budista tibetana] que viu um homem circunvalando [um ritual religioso, dando volta, caminhando] uma Stupa [monumento ritual de peregrinação]? O Gueshe lhe perguntou: ‘o que você está fazendo?’. O homem respondeu ‘circunvalando’. O Geshe disse: ‘não seria melhor se você praticasse o Dharma [conduta reta, leis universais]?’. Depois viu que o homem estava fazendo prostrações e quando lhe perguntou o que fazia, o homem respondeu: ‘estou fazendo cem mil prostrações’. ‘Não seria melhor se você praticasse o Dharma?’ - perguntou o Gueshe.

E assim continua a história, mas aqui o ponto é que só fazer atos que parecem ser devotos como as circunvalações e as prostrações não é necessariamente praticar o Dharma [seguir o Sistema de Deus]. O que temos que fazer é transformar nosso apego a nós mesmos e a atitude de autossatisfação. E se não mudarmos nossa mente desta forma, nenhuma das outras práticas que fizermos servirão; fazê-las é só uma brincadeira.” (Lama Thubten Yeshe)

O lama explicou a importância de uma atitude amorosa amável, uma forma de ser que os budistas chamam bodichita, de querer o bem-estar de todo o mundo, a todos os seres sencientes, de desviar a atenção de si mesmo em direção a todos os demais, igual como os profetas Jesus e Muhammad (Maomé); amor – Jesus pregou a todos, até aos inimigos e a vida do Profeta Muhammad foi um exemplo de amor puro.

Há algum tempo escrevi o seguinte sobre o tema:

“Na verdade há tantos caminhos como há pessoas, todos nós somos diferentes e todos temos necessidades espirituais distintas. Um lema sufi diz: “O amor é o caminho mais rápido até Deus”. O amor, o método do amor para conhecer a Deus e conseguir a “iluminação” é composto por compaixão e compreensão, um desejo de que outras pessoas sejam felizes e exitosas e que consigam a proximidade com Deus. Uma oração do budismo tibetano é:

Que todos os seres sejam felizes,
Que todos os seres se libertem do sofrimento,
Que ninguém seja despojado de sua felicidade,
Que todos os seres consigam igualdade, livres de ódio e de apego.

Querer que todo mundo seja feliz e que haja paz no mundo inteiro é logicamente impossível, mas o desejo de que aconteça é uma forma poderosa de romper a ilusão egocêntrica de separação. Como diz o Alcorão, todos somos criados a partir de uma única alma, todos estamos conectados, querer o bem de outra pessoa é querer o bem de uma parte de nós mesmos, ajudar a uma pessoa é ajudar a nós mesmos, amar a alguém mais é amar a nós mesmos. Querer que todo mundo seja feliz e livre de sofrimentos é uma forma poderosa de combater o domínio do ego.”

No tempo dos profetas as pessoas entenderam o porquê dos ensinamentos, o poder energético dos mestres era tamanho que suas palavras tocavam ao coração e não era necessária mais explicação. Hoje em dia tudo é diferente.

Hoje queremos saber: por quê?

“Os servos do Compassivo (Deus, ar-Rahman) são aqueles que vão pela Terra humildemente e que, quando os ignorantes lhes dirigem a palavra, dizem: Paz!” (Sagrado Corão 25:63)

Nossa realidade, o ser divino, reside em nós mesmos, mas está enterrado embaixo de uma invenção criada por nosso apego ao mundo e uma grande avalanche de influências mundanas – o ego, o grande EU. Não há outra maneira de chegar a conhecer nosso verdadeiro ser, nossa realidade, nosso núcleo divino, sem dominar o ego.
  
Falar de ego e de sua eliminação assusta a pessoas normais, creem que o ego é quem são, que o ego é sua individualidade e sem ele se tornariam menos, quando na verdade é o contrário, o ego nos torna pequenos, nos encolhe; além do ego há um vasto universo – todo um universo está dentro [de nós]. O ego é uma personalidade falsa, uma criação do mundo material e suas influências – na realidade não existe, é um fantasma. O ego é uma crença, é criado de fantasias de quem somos e assim nos restringe entre essas fronteiras, os limites que nós mesmos nos colocamos. Se você pensa que é isso, você não é tudo o demais.

O verdadeiro ser não tem limites, é parte da Realidade Divina. “E Ele é quem vos criou de uma só Alma...” (Sagrado Corão 6:98). Estamos conectados a todas as outras almas, somos mais que um indivíduo, somos parte de tudo e assim muito maior do que já experimentamos.

Somos tontos limitando nosso crescimento e desenvolvimento espiritual ao nos apegarmos a essa fantasia prejudicial, o ego, nossa imagem de ser.

Nossa salvação é nosso próximo, nossa atitude para com os demais, nossos bons desejos para com todos, nossa ajuda até os limites de nossas habilidades. Tudo isso implica uma luta contra nós mesmos, ou melhor, contra nossos interesses, orgulho, soberba, raiva, preconceitos, preconcepções e todo o demais que constitui a irrealidade que criamos.

Toda a negatividade, pensamentos e emoções negativas nos levam a vidas de sofrimento e dor. Temos que manter em mente que cada coisa que fazemos por outras pessoas, cada bom pensamento e emoção, na realidade estamos fazendo por nós mesmos.

Lembre-se o que é o amor. O amor é a frequência energética através da qual a guia de Deus flui. Faça a conexão. Ame e conecte-se.

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